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quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

Sozinha - Márcia Leite

Como já devem saber, sou uma professora de Português louca por livros, semelhante à grande maioria. No ano passado, minha escola recebeu exemplares de livros de leitura com uma grande quantidade de cada um. Logo fui perguntar se iríamos ganhar para que conhecêssemos as histórias e acabamos sendo presenteados.

O conjunto conta com O mistério do 5 Estrelas, livro que li na época em que era estudante, e gostei tanto a ponto de pegá-lo para mim. Era da famosa coleção Vagalume. A Fofa do terceiro andar, 2083 e Sozinha. O último que foi o escolhido para fechar os últimos dias de 2021.


Não sei se foi a melhor opção, porque se trata de um livro triste, uma história curta e dolorida sobre perder a mãe.


A história é narrada pela filha Julia que de repente se vê perdida sem a presença marcante da mãe. Em minha opinião, não deve ter dor maior, choque de realidade mais profundo do que, independente da idade, saber que a mãe morre. Como diz o poema de Drummond, mães deveriam ser para sempre. . Nunca estarei preparada para isso, não posso nem pensar nessa possibilidade.

"Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
(...)
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre "

E a filha dialoga com a mãe após a morte, como se ela estivesse ali e pudesse ouvi-la. Conta o que está acontecendo, como vai contar ao irmão menor, fala sobre os relacionamentos que tem, sobre sentimentos, sobre o pai, o estado do marido que ficou, sobre a insegurança que sente em relação a tomar qualquer decisão, sobre sua fragilidade e a falta imensurável da figura da mãe atuante.



Conforme os dias passam e as conversas continuam, Julia vai se tornando mais forte e aprendendo a conviver com essa nova forma de existência da mãe. É um processo lento sim, mas acredito que seja o caminho para se viver leve e aceitar a morte como parte da vida.

Posso afirmar por experiência própria, uma vez que entre tantas pessoas especiais, perdi meu pai - uma figura única e insubstituível. Hoje já faz 9 anos que ele se foi, mas é vivo em mim, sinto que acompanha minha vida, diverte-se, continua me livrando de umas enrascadas que nem eu entendo, está presente no cuidado com a casa, com a mãe, com os pássaros, com o jardim, nas reuniões de família... Quando você compreende que as pessoas que partem estão apenas em um plano diferente e que continuam, fica muito melhor viver e conviver. Faz parte de um processo evolutivo, mas cada um tem seu próprio tempo e fará as descobertas ao seu modo.



Apenas uma observação quanto professora. O livro tem indicação do 6° ao 9° ano, mas faz leves menções à relação sexual, no fato de a protagonista estar preparada ou não para esse momento. Devo ressaltar que Júlia tem 16 anos. Não acredito ser apropriado para 6° e 7° ano por exemplo. Para o 9° ainda me faria repensar...

SELEÇÃO DE TRECHOS...

"Daquele dia, guardo suas mãos entrelaçadas."
(Eu também.)

"E, pra provar que a vida não é mesmo como nos contos de fadas, nada aconteceu. Não havia feitiço a ser desfeito."

"Se hoje eu sei que a vida continua, naquela hora me pareceu o maior despropósito."

"Quem mandou você morrer? Não estava na minha agenda."

"Se você precisa de uma opinião sobre o que deve fazer, é porque não tem ainda a sua própria."

"Enquanto tiver alguma dúvida, enquanto não tiver certeza de que é isso mesmo o que você quer, não faça nada. Espere."

"Quando uma pessoa se encontra entre dois caminhos e não sabe por qual deles deve seguir, é hora de parar. Pensar. Sentir. O melhor caminho é aquele que tem coração."


"Se o começo de um namoro quase sempre é mágico e avassalador, descobri que o final pode não ter muitos encantos."

"Se você não consegue ver o meu lado e só se interessa pelo seu, então acho que a gente não tem mais nada para conversar, mesmo."
(Sei...)

"Pode ser que um dia a gente se veja, se encontre, sei lá. Pode ser até que eu me arrependa. Mas hoje eu não quero mais."

"Essa sempre foi a regra de convivência em nossa casa. Fazer o melhor possível."

"Ele demorou bastante para voltar a sorrir depois da sua morte, mais do que qualquer um de nós. Penso que nem mesmo ele se reconhecia. Perdeu-se de nós, do mundo e dele mesmo." (Tico da Dri)

"Preciso acreditar que vai ser possível viver sem ela."


"Você era muito nova. Não entenderia que as relações começam boas e às vezes tomam rumos que desconhecemos."

"Também fiz o melhor que pude naquele dia, ao esvaziar a casa de seus pertences. Talvez apenas o suficiente para deixarmos de tropeçar em você pelos quatro cantos da casa."

"Ele não tinha dificuldade de sobreviver sem você, ele não queria sobreviver sem você." (Tico de novo)

"Sentia-me culpada por deixar a casa em que vivêramos até aquele momento. Mas você tinha morrido e não existia no mundo um ritmo qualquer que, com repeat ou sem repeat, interrompesse a saudade a saudade que eu sentia de você e a vontade de que você voltasse de novo, de novo, de novo."


  que música eu sinto com outros sentidos, não tenho culpa se vaza pelos olhos."

"Acho que você está ficando velha. Crescer faz a gente ficar meio bobo."

"Tanta vontade de ser livre e tanto medo de não saber para onde ir."

"Gosto de pensar que exista no mundo um lugar que não é apenas um lugar. É uma memória, uma lembrança com cheiro de leite materno, onde me sinto confortada, abraçada, acolhida, mesmo sem ter você ao meu lado."

"Você soube quando partir, penso que também vai saber o momento de voltar."

"Alguma tristezas têm tamanho, cor e forma."

"E, embora eu tenha aprendido que as coisas acontecem independentemente de nosso desejo, queria ter algumas certezas."

"Quando se é criança, todos os caminhos nos levam para casa, mas, a partir de um momento, a única coisa que temos é nós mesmos."

"Algumas alegrias também têm tamanho, cor e forma."

"Provavelmente a terra, se olhada do mar, também apresente o mesmo mistério e, quem sabe, provoque a mesma sensação de infinito de quando se mira o horizonte da praia."

Este foi o último livro de 2021 e com ele
encerro minha singela lista de 13 livros.
Eu costumava ler 18, tivemos uma queda
na quantidade, mas jamais na qualidade.
O que importa é ler sempre. 
Minha mãe é que deu um show de leitura,
29 exemplares! Que orgulho!
Somos uma família unida na leitura também.
Até a próxima postagem, a tardia 
RETROSPECTIVA LITERÁRIA
como dica de leitura.



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