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domingo, 16 de setembro de 2012

Uma reflexão sobre Inteligência e as Lâmpadas....

Rubem Alves, em seu livro "O Sapo que queria ser Príncipe" no capítulo intitulado "Variações sobre a Inteligência" faz uma analogia muito rica entre a inteligência e as lâmpadas, que achei incrível e muito me fez pensar.

Vou transcrever alguns trechos para que eu possa compartilhar o que pensei...

"As lâmpadas servem para iluminar. Para isso, são dotadas de potências de iluminação diferentes. Há lâmpadas de 60watts, de 100 watts, de 150 watts... Esse número em watts diz o poder de iluminação da lâmpada. 
Também as inteligências servem para iluminar. (....) As inteligências, à semelhança das lâmpadas, também têm potências de iluminação diferentes.
(....)

As inteligências não são iguais. (...)
Mas nós não olhamos as lâmpadas, as lâmpadas não são para serem vistas. As lâmpadas valem pelas cenas que iluminam e não pelo seu brilho. Olhar diretamente para a lâmpada ofusca a visão. Há inteligências de WI 200 que só iluminam esgotos e cemitérios. E há inteligências modestas, como se fossem nada mais que a chama de uma vela, que iluminam sorrisos. (...) A chama de uma vela ilumina os recantos sombrios da alma. O brilho de uma lâmpada de 200 watts estupra os recantos sombrios da alma.

Uma lâmpada não tem vontade própria. Ela ilumina o objeto que seu dono escolhe para ser iluminado. A inteligência, como as lâmpadas, não tem vontade própria. Ela ilumina os objetos que o coração do seu dono determina que sejam iluminados. A inteligência de quem ama dinheiro ilumina dinheiro (...), a inteligência dos artistas ilumina a beleza. A inteligência é mandada. Só lhe compete obedecer."

Isso tudo me fez pensar em reunião de pais, em uma mensagem que gostaria de dar, e também me fez pensar tanto em meus alunos....
Tenho alunos que têm potência máxima de luz, ao passo que tenho aqueles cuja luz é tímida pelos cantos da sala. Essa timidez me permite transmitir mais luz, ao passo que para os outros sou apenas uma chama de vela.
Da mesma forma, acredito que há professores  de 60 watts e outros de 150. Mas os quais mais admirei na vida, como aluna, e hoje, como colega de trabalho, são aqueles que têm a humildade de clarear pequenos cantos e a sala inteira dependendo do momento.Um professor que ilumine claramente a sala o tempo todo cansa a vista, e aquele que não o faz dessa forma, pode despertar o sono ou o sonho...

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Rubem Alves: O sapo que queria ser príncipe


Termino de ler um exemplar de Rubem Alves que adquiri na última ida a Campinas. Sofri ao vê-lo por um tempo, pois gastei mais de dez reais do preço que poderia ter encontrado pela Internet. Até comentei com meus alunos, que deram risada. Mas não suporto perder dinheiro... Por isso que as vendas  por esse meio aumentaram, já que os sites são confiáveis, conseguimos parcelar a compra e temos o conforto de receber em casa, pagando um preço muita vezes muito inferior em relação ao da loja.
Pensando bem há tantas vantagens... Podemos analisar o quanto queremos o livro, não há um atendente querendo nos empurrar um exemplar com seu conhecimento superficial da obra, ou simplesmente pessoas lançando-nos olhares. 
Por outro lado, nada substitui minha alegria de entrar numa livraria, tocar os livros, observar inúmeros romances novos, dos mais variados tipos. Sou apaixonada por esse universo a ponto de perder, eu diria, na verdade, ganhar horas em companhia dos livros...

Deixo aqui minha lamentação por não ter ido à Bienal este ano! Há dois anos, voltei apenas com um livro nas mãos, mas com todo encanto do lugar, dividindo o espaço com milhares de apaixonados como eu... Vale dizer que também era um exemplar de Rubem Alves.

Conheci Rubem Alves por meio de uma professora na época da escola ainda, que me presenteara com um livro dele: "Concerto para o corpo e alma". Foi assim que o descobri e me apaixonei. No decorrer dos tempos, pude vê-lo em muitas palestras, assisti a vídeos de entrevistas, ouvi um audiolivro e tudo isso só aumentou minha admiração, além de permitir carregar comigo sua voz. Sim, quando leio, posso ouvi-lo dizendo as mesmas palavras.....

"O sapo que queria ser príncipe" é um título poético, e como tudo que evoca beleza, carrega também, em suas entrelinhas, tristeza. Ele tinha vontade de ser príncipe, mas não era. Em suas memórias, ouvimos o coaxar desse sapo menino, passagens marcantes e marcadas de sua vida.

Eu me divirto com os pontos em comum que estabeleço entre eu e Rubem Alves: nesse exemplar ele conta de um professor que queria que ele subisse na corda... e ele nunca conseguiu. Somos dois...  Gostar de caipirinha é outro. Além do modo como se refere às verdades incontestáveis da religião. Somos crentes meio descrentes em algumas coisas... Isso sem contar o amor por Campinas, pelas belezas da vida, pelo amor, paixão, pecados......


Termino com um trecho que diz tudo sobre Rubem Alves, sobre "nosso relacionamento" entre livros:


"Um jovem desconhecido, sem se apresentar, fez-me uma pergunta brusca: Quem lhe deu permissão para entrar dentro da minha alma? (...) Respondi: Nunca entrei dentro da sua alma. Entrei dentro da minha alma e a sua estava lá"



MINHA SELEÇÃO DE TRECHOS... 


"Os relógios não tinham uso. Pra que marcar os segundos e os minutos? Era a passagem do trem que marcava o tempo, só havia dois tempos: o antes do trem e o depois do trem. (...)Era assim mesmo, tempo de Minas, tempo que anda sem pressa."

"Por que será que todo fim de tarde é triste? Acho que é porque crepúsculo é despedida. (...)Com um olhar de despedida, a beleza fica mais triste. Até o voo dos pássaros fica diferente."

"A gente acostuma com tudo.(...) Desaprendi o silêncio e aprendi o barulho. (...) Depois de algum tempo, é o silêncio que tira o sono. Porque no silêncio, quando não há bichos soltos do lado de fora, os bichos que moram dentro começam a uivar. O bom do barulho da cidade é que ele abafa os barulhos dos bichos da alma."

"A guerra acabou. Perguntei ao meu pai: 'Agora que a guerra acabou sobre o que os jornais vão falar?'. Ele respondeu: 'Sobre política.' Fiquei desapontado. Eu preferia os jornais da guerra. Nele havia heróis (...)"

"O que enlouquece não é o trabalho forçado; é a falta de sentido."

"A raiva tem memória boa."

"Meu corpo é do tamanho do meu olhar. Os olhos do poeta têm braços que vão até as estrelas.
Tenho dó das estrelas luzindo há tanto tempo, há tanto tempo... Tenho dó delas. Não haverá um cansaço das coisas, de todas as coisas... Um cansaço de existir, de ser, só de ser, o ser triste brilhar ou sorrir..."

"Livros são espelhos. Gostamos de um livro não por causa de eventuais informações que ele nos passe, mas porque nos vemos refletidos nele."

"As imagens são efêmeras."

"Que é que o amante deseja da amada? O seu corpo? O corpo da amada não lhe basta. Ele precisa dos seus olhos adorantes, que lhe dizem em silêncio: Que bom que você existe."

"Deus ajuda a quem cedo madruga. Eu madrugava, inutilmente. Mas Deus não conhecia o ditado. Não me ajudava.(...) Aprendi que o ditado verdadeiro é "Aqueles que Deus ama não precisam madrugar." 

"Que eu me lembre, ela nunca me falou de religião. Nunca tentou me converter para salvar a minha alma. Ela sabia que eu já estava salvo."

"Um amigo é uma pessoa que adivinha e faz silêncio."

"Peca-se por fazer e peca-se também por não fazer.(...) Há apenas um pecado imperdoável: o de deixar uma mulher desejando. (...) Pequei muito por não ter pecado, e ainda hoje peço perdão a Deus pelos pecados que não cometi."

"Natal era música. As mesmas de sempre. O Natal não suporta novidades. As músicas nos levavam para um lugar mágico do passado, uma noite com um céu coberto de estrelas. É uma cena mansa que, acho, mora na alma de todo mundo. As músicas acordam a cena do seu esquecimento. Vem então a nostalgia."

"É impossível construir qualquer coisa quando um fala e os outros não entendem."

"Quando a paixão não se realiza na realidade, ela se transforma em poesia, seja a poesia das palavras, seja a poesia dos gestos."

"Fernando Pessoa disse que a maior crítica ao romantismo ainda não foi feita e é a seguinte: todos somos irremediavelmente românticos."

"O mundo não muda. É do jeito que é porque Deus quer. Mas há uma coisa que pode ser mudada: o jeito de andar nele. (...)"

"Formigas são espertíssimas. Nunca seguem a mesma trilha. Olho para o gramado e vejo as novas trilhas que elas abrem a cada novo dia."

"No momento da batalha, o herói não pode ter dúvidas."

"Eu nada dou e nada tiro, disse o professor. Eu só verifico a nota que você realmente tirou. E lhe falta um centésimo. Eu não posso dar algo que você não tem. Eu não o reprovei. Você se reprovou..."

"De repente eu estava flutuando no ar, sem um ponto firme onde me agarrar. Sem ter onde me agarrar, o jeito foi aprender a voar... Tratei de bater minhas asas."

"A beleza está além das palavras. Ela faz o pensamento parar."

"Sente-se melhor quando não se pensa."

"O amor, por vezes, esconde-se onde não se imagina. Pois não e verdade que há flores que crescem no deserto?"

"Se o seu casamento estivesse podre, eu abençoaria sua decisão de partir para um novo amor. Mas, se você vai partir movido pela paixão, não vá. A paixão - deliciosa- tem vida curta."

"Palavra enfeitiça. Palavra quebra feitiço."

"Saudade tem a ver com o longe, a impossibilidade do abraço. Quando a separação acontece, a saudade penetra como uma lâmina, instantaneamente. Ela penetra lancinante mesmo quando quase nenhum tempo se tenha passado."

"As cartas de amor não são para comunicar informações. Elas são para serem tocadas, beijadas, guardadas debaixo do travesseiro, dentro da carteira." (...) escreve-se uma carta não para dar notícias, mas para abraçar de longe e, assim, burlar um pouco a saudade."

"A saudade me fez trabalhar muito. Trabalhava para esquecer a saudade."